quarta-feira, 3 de novembro de 2010

A construção da imagem de Hitler

Este texto é composto de fragmentos do meu trabalho de conclusão de curso. 


      Apresentação

“Rudolf Hess, filho de um comerciante atacadista e estudante da Universidade de Munique, escreveu uma dissertação premiada que respondia a Questão” Que tipo e homem irá liderar a Alemanha de volta à glória de seu passado?”. Quando conheceu Hitler, em 1920, ficou impressionado com a semelhança entre o que escrevera e o homem que estava ali em sua presença. Hitler sentiu-se tocado pela dissertação e ficou impressionado com o homem que tivera uma percepção tão aguçada. Não é de admirar que tenham se tornado amigos tão íntimos”.
Acima de tudo‑‑‑disse Hess--- esse indíviduo teria de ser um homem do povo, cujas raízes estivessem profundamente firmadas nas massas, para que soubesse como trata-las psicologicamente. Somente um homem assim poderia conquistar a confiança do povo, o que, entretanto, seria sua imagem pública “.[1]

 

Hoje em dia quando ouvimos falar nos acontecimentos da Segunda Guerra Mundial, não paramos para pensar como foi possível, uma população tão culta e com um elevado nível de civilização como o povo alemão, confiarem cegamente, em sua grande maioria, nos seus governantes a ponto de aceitarem as ordens mais brutais. Pretendemos nesta pesquisa, estudar a criação da imagem e do mito do führer que foi produzido no filme O Triunfo da Vontade, um documentário sobre o congresso do NSDAP, em Nuremberg no ano de 1934. A partir deste documentário foi possível dar início à construção desta imagem em Hitler.

Resumo

Esta é uma proposta de investigação sobre a construção de uma narrativa cinematográfica arquitetada no filme O triunfo da Vontade, na qual procuramos analisar como a imagem de Adolf Hitler foi construída neste filme.
O objetivo central desta pesquisa é analisar passo a passo como uma produção cinematográfica pôde transformar a pessoa de Hitler na figura do führer, ou seja, aquele que, segundo os nazistas, irá o liderar a nação alemã de volta aos tempos de glórias. 

                          Introdução

Para realização deste trabalho foi necessário o estudo do envolvimento da Alemanha na 1ª Guerra Mundial e de sua situação no período que antecedeu a produção do filme O triunfo da Vontade. Para melhor compreensão deste ensaio, esta pesquisa foi dividida em três partes: Na primeira parte foi feito um resumo da participação e dos motivos que levaram a Alemanha para a Primeira Guerra Mundial, em seguida foi feito um pequeno balanço das circunstâncias em que estava a Alemanha no pós-guerra, com destaque para o Tratado de Versalhes, o crash da bolsa de valores de NY e um pequeno resumo das idéias do NSDAP. Na segunda parte da pesquisa, analisaremos os aparelhos de propaganda utilizados pelos nazistas, apenas para entendermos um pouco como era sua utilização, dando destaque para o rádio, o cinema, cartazes, arquitetura e literaturas. Na última parte da pesquisa analisaremos a produção cinematográfica O Triunfo da Vontade de Leni Riefenstahl e, verificaremos com foi feita a construção da imagem de Hitler passo a passo nas cenas que ocorrem no filme. 

                   Metodologia

A metodologia utilizada neste trabalho foi o de pesquisa teórica e bibliográfica em livros e filme. Em virtude do grande número de material encontrado, procuramos limitar ao máximo nossa pesquisa, mais diretamente ao objeto proposto. Para trabalharmos o resumo da primeira guerra mundial e a situação da Alemanha no pós-guerra utilizamos como bibliografia principal o livro “A Era dos Extremos” (Hobsbawm) e “A Alemanha de Hitler” (Stackelberg). Na pesquisa referente aos aparelhos de propaganda foram utilizadas basicamente as obras “Propaganda e Persuasão na Alemanha Nazista” (Dihel) e “A Cruz de Hitler” (Lutzer). E finalmente para analisarmos as imagens da produção cinematográfica “O Triunfo da Vontade”, utilizamos como corrente historiográfica a História Cultural, tendo como principal obra pesquisada o livro “História & História Cultural” (Pesavento). Para servir de “guia” para nosso projeto, o livro “A Pesquisa em História” (Vieira) foi bastante utilizado no sentido de nos orientar sobre qual a melhor maneira de se elaborar a pesquisa.  

                                   PARTE I
A primeira guerra mundial

Para entendermos a situação em que se encontrava a Alemanha no período em que o documentário foi produzido e exibido, é preciso voltar alguns anos no tempo, mais precisamente em 1914, o ano em que se iniciou a Grande Guerra na Europa. A Europa vivia um período de tensão e grande rivalidade entre as potências européias. Essa tensão resultava de disputas territoriais e por novos mercados, tanto na Europa como fora dela. Os empresários buscavam novos mercados que consumissem seus produtos, o que levou o governo dos paises industrializados europeus a disputar colônias na África e na Ásia.
Ao mesmo tempo, o governo de cada país industrializado procurava dificultar a expansão econômica dos demais, fechando seus mercados aos produtos importados e tentando impedir a expansão do império colonial dos concorrentes. Essa disputa envolveu principalmente interesses ingleses, alemães e franceses.
Ligados a essas disputas econômicas e por colônias havia os movimentos nacionalistas, que pretendia agrupar sob um mesmo Estado povos de matrizes culturais semelhantes o que levava a um desejo de expansão territorial.Entre os principais movimentos nacionalistas que se desenvolveram na Europa no inicio do século XX, destacaram-se o pan-eslavismo e o pan-germanismo. Os pan-eslavistas, liderados em certa medida pelo governo russo, queriam unir todos os povos eslavos da Europa oriental. Os pan-germanistas pretendiam anexar à Alemanha os territórios da Europa central onde viviam germânicos. Além disso, havia o revanchismo francês, movimento nacionalista pelo qual o governo visava recuperar os territórios da Alsácia-Lorena, região rica em minério de ferro e carvão que os franceses foram obrigados a entregar aos alemães depois da derrota na Guerra Franco-Prussiana, em 1870. O clima de rivalidades deu origem a chamada paz armada: diante do risco de guerra, as potências iniciaram uma corrida armamentista, fortaleceram seus exércitos e formaram alianças políticas.
Os governo das grandes potências formaram tratados de alianças para somar forças para enfrentar os rivais, depois de acordos bilaterais a Europa, em 1917 ficou dividida em dois grandes blocos:
Tríplice Aliança: formada inicialmente pela Alemanha, império Austro-Húngaro e Itália, que no decorrer da guerra através de acordos passou para o outro lado;
Tríplice Entente: formada inicialmente por Inglaterra, França e Rússia que devido a revolução em seu país abandonou a guerra após acordo com a Tríplice Aliança.
Após várias crises (Marrocos e crise balcânica) e o assassinato do arquiduque austríaco Francisco Ferdinando e sua esposa em 1914 quando visitava Sarajevo, provocou uma reação militar da Áustria contra a Sérvia que recebeu o apoio da Alemanha e, temendo um aumento do domínio austríaco na região a Rússia declarou guerra a Alemanha e recebeu o apoio da França e Inglaterra. Depois de quatro anos de guerra e com o apoio material e financeiro dos EUA as alianças formadas pelas potências inglesas, francesas e russas venceram os alemães e estes foram obrigados a aceitar o armistício (acordo de paz) e as duras imposições aos derrotados, principalmente a Alemanha no que ficou conhecido como o Tratado de Versalhes.

O Tratado de Versalhes
Assinado em 28 de junho de 1919, o Tratado de Versalhes imposto aos derrotados pelos vencedores na Grande Guerra, este acordo impunha principalmente aos alemães duras condições no pós-guerra dentre elas as que mais prejudicaram foram: o pagamento de enormes indenizações em dinheiro aos países vencedores, reduzir o poderio militar de seus exércitos a no máximo um efetivo de 100 mil homens, sendo proibida de constituir aviação militar e marinha de guerra, restituir a região da Alsácia-Lorena à França, ceder outras regiões à Bélgica, à Dinamarca e à Polônia além de assumir toda a responsabilidade e danos causados pela sua agressão e de seus aliados como conseqüência da guerra. Após estes acordos e a abdicação do imperador Guilherme II, em novembro de 1918, fora instituído na Alemanha o que ficou conhecido como a República de Weimar.
A democracia liberal instalada na Alemanha no pós-guerra não agradava aos alemães e não atendiam as necessidades do povo que enfrentavam muitos problemas com a falta de emprego que assolava grande parte da população, a economia alemã estava em frangalhos devido aos esforços de guerra e as duras condições impostas pelos vencedores, surgiram em todo o país segundo Stackelberg “levantes revolucionários da esquerda e tentativas contra-revolucionárias de putsch e uma campanha de assassinatos terroristas da direita, movimentos separatistas na Baviera e Renânia”. [2]A Alemanha estava dividida, comunistas (KPD, SPD, USPD), partidos de direitas (NSDAP, DNVP) e liberais começaram a brigar para alcançar o poder. Para piorar a situação, em 1929 ocorre o crash da bolsa de valores de Nova York e a Alemanha mergulha num abismo econômico que piora ainda mais a situação do país. O desemprego que em 1929 era de 1,3 milhão de pessoas passa para mais de 6 milhões de desempregados em 1932, a moeda ( marco alemão ) se desvalorizou de tal forma que bilhões de marcos mal davam para comprar um pedaço de pão. Para se entender melhor como a Alemanha era vista nessa época de crise, um grande poeta alemão de nome Brecht nos relata em sua poesia esta situação:

Alemanha, loura e pálida
De nuvens selvagens e fronte suave!
Que aconteceu em teus céus silenciosos?
Agora és o lixo da Europa

Abutres sobre ti!
Bestas rasgam teu corpo bom
Os moribundos te emporcalham com suas fezes
E a sua água
Molha teus campos.Campos!

Como eram suaves teus rios
Com os dentes as crianças
Arrancam teus cereais
Famintas

Mas a colheita flutua
Na água que fede!
Terra de lixo, monte de tristeza!
Vergonha sufoca a lembrança![3]

A miséria crescente fez diminuir a confiança do povo, o que abriu espaço para nazistas e comunistas. A Alemanha não poderia mais arcar com as altas indenizações que fora obrigada a pagar e a Republica de Weimar não agüentaria a pressão. Os direitistas acusavam o sistema liberal de ser fraco para enfrentar os aliados e os esquerdistas desprezavam o sistema liberal por ser exposto à influência das elites burguesa e autoritária. A cada dia que se passava à situação alemã só tendia a piorar e cada vez mais os direitistas, principalmente os nazistas, alcançavam novos adeptos.

      O programa de governo do NSDAP

O programa de governo do NSDAP, formulado em 1920, contém vinte e cinco pontos, e neles, entre outras idéias, os nazistas exigiam a abolição do Tratado de Versalhes (ponto dois), pois este impedia, segundo eles, a Alemanha de crescer, e de se igualar com as demais nações. No quarto ponto deste programa diz: ”Somente os membros do povo podem ser cidadãos do Estado. Só pode ser membro do povo aquele que possui sangue alemão, sem consideração de credo. Nenhum judeu, portanto, pode ser membro povo “.[4]Com esse ponto Hitler e os nazistas perseguiram incansavelmente os judeus até o seu desfecho final, culminando com a morte de milhões de judeus no episódio da história que ficou conhecido como o Holocausto.
Entre outras propostas deste programa, esta o que eles chamavam de “reunião de todos os povos alemães numa grande Alemanha” contidas no primeiro ponto, e a conquista de terras (colônias) para alimentar o povo alemão (ponto três). No inicio, em sua formação o NSDAP ainda era um partido pequeno, como a maioria dos partidos que surgiam neste período tão conturbado em que vivia a Alemanha, mas com a entrada de Hitler no partido em setembro de 1919, com sua grande retórica e carisma conseguiu gradativamente atrair o povo alemão para os ideais do partido. Hitler sabia como explorar a situação do povo alemão humilhado e derrotado. Buscava inspiração nas belas melodias de Richard Wagner e praticava todos os seus discursos em frente a um grande espelho. Ele planejava pessoalmente todas as entrada em cena, desde a decoração do local as canções a serem tocadas, fazia discursos grandiosos contendo palavras fortes como ódio, cruel, esmagar entre outras. Arrumou como álibe o povo judeu, para que as pessoas pudessem odiar, culpá-los pelos problemas que eles causaram pela “traição econômica” trazendo com isso a diminuição dos esforços de guerra alemã, acusavam-nos de “apunhalar a Alemanha pelas costas”, e culpavam os comunistas de apoiarem o comunismo internacional, e as pessoas que não o ouviam e aceitaram a abdicação do imperador Guilherme II. Mudou o nome da agremiação de Partido Alemão dos Trabalhadores para Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães em 1920. Uniu a antiga brigada de defesa (SA) integrando-as com a SS, tornando o seu esquadrão de defesa pessoal e criando a policia secreta chamada de Gestapo, para cuidar das questões políticas e punir os intelectuais contrários aos ideais do partido. Utilizou como símbolo do partido a cruz gamada ou suástica (ver figura 1 no anexo).
Hitler idealizou os princípios de uma forte maquina de propaganda, comandada e instrumentalizada pelo filósofo Dr. Joseph Goebbles, que se tornou ministro da propaganda em 1928.Com este instrumento tão poderoso em suas mãos, incentivaram e levaram a Alemanha até as ultimas conseqüências em busca de seus ideais pessoais e partidários. No próximo tópico iremos trabalhar alguns dos instrumentos propagandisticos utilizados para persuadir e atrair as massas para causa nazista.

 PARTE II

       Instrumentos de propaganda


Em sua obra Minha Luta, produzida enquanto Adolf Hitler estava preso, ele escreveu: “a propaganda trata de impor uma doutrina a todo o povo (...) A vitória de uma idéia será mais fácil quanto mais intensa for a propaganda”.[5]Os nazistas acreditavam que com uma boa argumentação e uma propaganda adequada alcançariam os seus objetivos. Todos os tipos de elementos foram utilizados pelos nazistas em prol da conquista de seus ideais, dentre estes instrumentos podemos destacar alguns dos principais itens empregados, e baseando-se na obra de Dihel, destacam-se: o rádio, o cinema, os cartazes, a arquitetura, a literatura, a música entre outros.Trabalharemos agora alguns destes importantes instrumentos de persuasão.

               O rádio


O rádio foi bastante utilizado pelos nazistas e teve papel fundamental para eles, principalmente na subida ao poder até 1932, período que antecedeu a ascensão do NSDAP, em seguida foi dado mais atenção ao cinema. Mas no período entre 1928 e1930 o rádio foi incansavelmente utilizado, já que havia uma necessidade ideológica de conseguir o máximo de votos possíveis visando as massas para as eleições de 1930. Os partidos políticos tinham um tempo de quinze minutos do horário reservado para as propagandas, exceto o NSDAP e o partido comunista, o KPD. Com o passar do tempo, os nazistas com a influência que estavam conquistando aos poucos em todas as áreas públicas, conseguiram o direito de veicular sua propaganda de rádio. Em 1930 com as eleições de setembro para o Congresso os nazistas conseguiram ampliar o número de cadeiras de 12 para 107, trinta a mais que os comunistas, o que facilitou ainda mais para o NSDAP. Os nazistas aproveitaram este crescimento e a influência do rádio para trabalhar sua “plataforma socialista”, prometendo ajudar com empregos os camponeses e a pequena burguesia, mas visavam também cair nas graças da classe média e dos grandes industriais, e para isso prometeram afastar a perigosa influência simbolizada pelos comunistas. Foram instaladas antenas de rádios na Alemanha e megafones para que as ideais do partido chegassem aos lugares de difícil acesso. Com o uso do rádio foi possível exaltar os principais conceitos do partido através dos discursos de Hitler e Goebbles, já que este instrumento era o principal meio de informação da população.   
                     

             O cinema


O cinema teve papel fundamental para os nazistas em promover a imagem do mito do Führer, liderada pela cineasta pessoal de Hitler, Leni Riefenstahl. Segundo Pesavento “a imagem possui uma função epistêmica, de dar a conhecer algo, uma função simbólica, de dar acesso a um significado, e uma estética, de produzir sensações e emoções no espectador”.[6] Os filmes na maioria deles eram de cunhos nacionalistas e visavam entre outros fatores exaltar o heroísmo, o patriotismo e o espírito alemão, além de conter muitas idéias racistas e preconceituosas. E foram nas produções cinematográficas que os nazistas despejavam todo o seu ódio contra os judeus e comunistas, faziam dos filmes a exaltação para a guerra, mostravam a “magnitude e o esplendor” do nazismo. Dentre as várias produções destaca-se O Triunfo da Vontade (fonte de nossa pesquisa), em que Hitler é “endeusado”, e comparado a um ser superior. Os nazistas manipulavam as mentes das pessoas através das produções cinematográficas e, aplicavam este recurso nos ambientes de trabalho e principalmente nas salas de aulas. Estima-se que cerca de 40 mil escolas dispunham-se de sala de projeção num total de 62 mil existentes nessa época, tal qual era a importância deste instrumento propagandístico. Nas produções anti-semitas destacam-se como principais produções O Judeu Süss e O Eterno Judeu, clássicos da era nazista.



             Cartazes


Os cartazes foram muito utilizados pelos nazistas devido a sua grande facilidade de manuseio, geralmente espalhados pelos meios urbanos. Nos cartazes a utilização de cores fortes era fundamental, principalmente o fundo do cartaz em vermelho, que exaltava as cores da bandeira nazista e confundia a população com as cores do comunismo. Os nazistas colavam os pequenos cartazes em cilindros e utilizavam letras grandes, geralmente na cor vermelha para chamar mais atenção.  Difundia-se nestes cartazes os ideais do partido dentre eles o anti-semitismo, o anticomunismo, a Juventude Hitlerista e claro, a imagem de Hitler, sempre envolta dos símbolos nazista.

             A arquitetura


A arquitetura nazista baseava-se no estilo neoclássico, demonstrando toda a grandiosidade do regime nazista, inspirando nos monumentos gregos e romanos, bastante admirados por Hitler. Albert Speer foi o seu grande arquiteto e projetou entre outras obras o Estádio de Nuremberg, palco dos grandes discursos nazistas, a chancelaria onde Hitler e alguns líderes do Reich passaram seus últimos dias, o Estádio Olímpico, palco das olimpíadas de 1936, a Galeria de Arte de Munique, entre outros. Na arquitetura nazista, percebe-se uma proporção monumental das construções, tudo isso para mostrar ao povo como seria a nova reorganização do planeta, que começaria na Alemanha e se estenderia ao resto do mundo.Apontava também a estética da nova Alemanha, e estas grandes construções estariam espalhadas por todos os cantos.

 Música e literatura

Na era nazista os principais intelectuais foram expulsos da Alemanha, ficando apenas aqueles que estavam de acordo com a ideologia do regime.A música era basicamente composta por hinos feitos para entidades como a Gestapo, a SS e a juventude Hitlerista como uma forma de incitamento para os ideais do partido, exaltando principalmente as características históricas da Alemanha como nas canções épicas de Richard Wagner. As literaturas eram bastante utilizadas em difundir o anti-semitismo.Obras como Minha Luta, escrito por Adolf Hitler, se transformou no principal produto para difundir as idéias do nacional-socialismo.O livro se tornou o evangelho do nazismo, nele Hitler descreve o tipo de cidadão ideal para a nação, estando incorporado em todas as escolas, sendo obrigado a estar presente em todas as salas de aula da Alemanha.Nesta obra, Hitler descarrega todo o seu ódio contra os judeus, comunistas e todos os “inimigos do povo”. Podemos destacar também a obra O mito do século XX, escrito pelo ideólogo da doutrina Hitlerista, Alfred Rosenberg, em que exalta entre outras idéias a tese do arianismo, e o preconceito contra os judeus. Em 1933 ocorreu a grande queima de livros, onde as obras consideradas não alemãs foram queimadas e, intelectuais como Freud, Einstein, Brecht entre outros foram expulsos da Alemanha, o que favorecia os nazistas de impor apenas obras alinhadas com o regime.

PARTE III

A construção do mito do führer

Adolf Hitler era um excelente orador, acreditava que para conseguir alcançar seus ideais bastava organizar um ótimo aparelho de propaganda. Apesar de ser um grande líder populista, e ter conquistado aos poucos a confiança do povo alemão, faltava transformar sua figura na pessoa mais adequada a guiar a nação alemã, rumo a conquista dos ideais do NSDAP. Hitler queria passar a população à imagem de ser um líder enviado pela providência, ou seja, de que ele era uma indicação divina. Os nazistas acreditavam veemente nas forças místicas, inclusive muitos de seus líderes pertenciam a sociedades secretas, mas faltava a idéia de que Hitler fosse aquela pessoa sagrada, o führer, o único que poderia governar na Alemanha e trazer de novo a glória da nação, derrotada na 1ª Grande Guerra e humilhada no Tratado de Versalhes. Hitler seria o único preparado e mais indicado a constituir o Terceiro Reich na Alemanha. Segundo Lutzer na 1ª Guerra Mundial, “Hitler se apresentava como voluntário para missões de risco, não tanto por sua bravura, mas porque acreditava que o destino o havia tornado invencível. Ao atravessar uma rajada de balas, ele atentava a providência, assegurando-se de que não poderia morrer até que sua missão fosse cumprida (...) acreditava ter sido chamado para um papel que lhe fora reservado por forças superiores”.[7]
Hitler talvez tenha escolhido produzir um filme devido ao impacto que uma produção cinematográfica pode causar nos espectadores. Além do mais em um filme é possível dar mais atenção aos detalhes, que são fatores imprescindíveis para atrair o público para a mensagem que se quer passar. Segundo Pesavento, “as imagens estabelecem uma mediação entre o mundo do espectador e o do produtor, tendo como referência a realidade, (...) afinal, palavras e imagens são formas de representação do mundo que constituem o imaginário”.[8]
Agora analisaremos a produção cinematográfica O triunfo da Vontade, discutindo passo a passo às cenas do filme. A produção foi dirigida pela cineasta Leni Riefenstahl, e os nazistas encomendaram esta produção para mostrar o sexto congresso do partido, que foi realizado no estádio de Nuremberg no ano de 1934. A equipe contava com 170 pessoas, incluindo 16 cinegrafistas e 16 assistentes de câmeras, contendo também 29 cinegrafistas de jornal cinematográfico. A produção levou dois anos para ser montada, sendo exibido pela primeira vez em 1936, com duração de 110 minutos. As pessoas responsáveis pelas filmagens estavam vestidas como homens das SA, para facilitar o acesso ao trabalho e dar a idéia de realidade no filme. Na produção são mostrados todos os desfiles das SA e SS tanto na abertura como no encerramento do congresso.A figura de Hitler sempre esta em volta de grandes multidões que não paravam de aplaudir, e a diretora não deixava escapar nenhuma pose do führer que sempre estava muito feliz, mais ao mesmo tempo não perdia seu semblante de uma pessoa rigorosa.O filme começa com a aparição da águia e da suástica, símbolos do nazismo, em seguida aparece a data “5 setembro de 1934” e os dizeres” 20 anos após o início da Grande Guerra Mundial ,16 anos após o início do nosso sofrimento, 19 meses após o renascimento alemão”. Em seguida aparece a imagem do céu vista de dentro do avião em que estava Adolf Hitler. O uso de nuvens, sombras fumaças e luzes criam um efeito de mistério para sua chegada e o documentário que deveria começar com a abertura do congresso se inicia com a chegada do führer, e isso já mostra aos espectadores quem é a figura central do partido. Hitler aparece como um “enviado dos céus”, e aquele clima de mistério muda instantaneamente com a sua chegada. Na vista de cima do avião percebe-se as marchas das tropas e o balançar das bandeiras, a canção “Horst Wessel” começa a tocar ao fundo induzindo um clima emocionante ao espectador. Quando Hitler chega ao aeroporto ele é recebido com honras e louvores por uma multidão estarrecida que o aguardava. Em seguida ele desfila de carro aberto nas ruas de construções medievais da Alemanha, sempre aplaudido pelas massas e acenando com as mãos erguidas para o céu, percebe-se que as pessoas estão empurrando umas as outras para poder ver de perto o führer. Ele esta sempre com o corpo ereto demonstrando confiança e as câmeras estão sempre focando os sorrisos das pessoas presentes no local. Hitler parece estar no meio de uma procissão religiosa onde as pessoas o aplaudem e o homenageiam como se fosse um santo católico. A alegria da multidão nos traz a impressão de que estas pessoas estão no desfile por vontade própria e não por obrigação, inclusive nos discursos de Hitler, percebe-se o semblante de alegria no rosto de todos presentes no desfile e, o povo vibra quando Hitler discursou que “200 mil homens estão reunidos aqui apenas atendendo ao apelo do coração”.
No caminho do aeroporto ao hotel, as pessoas o seguem com tochas nas mãos, como se ele fosse algum líder religioso, adorando-o e prestando homenagens ao seu líder. No dia seguinte a cidade amanhece tranqüilamente e logo se vê um grupo de homens, mulheres e crianças a caminho de Nuremberg para praticar as mais diversas atividades, e muitos deles trazem produtos agrícolas como se fossem oferendas para darem ao führer, dá-se à impressão de que Hitler é o responsável pela prosperidade da nação e que é o ponto de união de todos os alemães. Na próxima cena registra-se a abertura do Congresso dos delegados, onde nos discursos eles exaltam à imagem do führer, associando sua pessoa à nação como o líder máximo da Alemanha, trazendo o progresso, a prosperidade e representando a esperança. Em uma próxima cena acontece o encontro de Hitler com os trabalhadores que lhe juram fidelidade e prestam novamente homenagens ao seu líder. Mais uma vez o filme nos passa a idéia de que Hitler consegue concentrar num mesmo lugar trabalhadores de todas as partes da nação e, segundo os relatos dessas pessoas ele é o responsável pelo renascimento da Alemanha. Estes trabalhadores aparecem organizados em fila como se fossem soldados e, nos passa a idéia de disciplina, respeito e ordem, princípios fundamentais do nazismo. Em uma próxima cena, soldados das SA em assembléia, assim como trabalhadores prestam honras e homenagens ao führer, em seguida é a vez da Juventude Hitlerista desfilar no Estádio da Juventude e estes também juram lealdade a Hitler, que em seguida profere mais um de seus discursos emocionantes e dramáticos. Em seguida, após várias demonstrações de lealdade e adoração, Goring, líder da Luftawe (força aérea alemã), e outros oficiais militares passam por uma revista das tropas e da infantaria dando ênfase ao potencial de guerra da Alemanha. Já próximo ao final do filme, a diretora Leni Riefenstahl volta a divulgar a imagem de Hitler, em uma grande assembléia o führer discursa novamente à multidão. Desta vez ele fica em um local elevado, “acima” dos outros homens, e os milhares de membros do partido quase desaparecem no meio das bandeiras e multidões de espectadores. Após este discurso começa o ritual em memória aos “heróis” mortos.Tem-se a impressão de que no tributo aos mortos Hitler seria o “pai da criação”, responsável pelo surgimento da nova Alemanha, parece que ele esta trazendo a Alemanha de volta a vida, pelas suas “mãos abençoadas” e em contrapartida quase um milhão de pessoas marcham como se fosse uma única força liderada pelo poder iluminado do führer. Hitler traz para a Alemanha uma nova religião para o seu povo: o nazismo, e aos poucos ele molda os alemães, através de seu aparelho de propaganda. Nas últimas cenas deste documentário, acontece uma parada por parte dos militares e dos trabalhadores alemães e Hitler sempre esta à frente das tropas como um líder profético. No encerramento do congresso, o führer faz seu último discurso em que se consagra como condutor da nação, comandante das forças militares e líder máximo do partido nazista de toda a Alemanha.
Hitler é aclamado por todos que estão presentes no congresso como o símbolo da nação, e no filme a imagem que se tem é que os alemães se uniriam em uma única força liderada pelos führer e por sua determinação em ser a pessoa mais adequada para levar a Alemanha novamente aos seus dias de glórias. A figura de Hitler é produzida constantemente durante a apresentação do filme e sua pessoa sempre aparece no meio dos símbolos que representam o nazismo, dando ênfase a sua imagem. Na verdade o que Hitler queria, era trazer o ideal de beleza física, harmonia, perfeição, ordem e disciplina, que o filme O triunfo da Vontade nos mostra muito bem. Podemos ressaltar neste filme o poder que a propaganda causa nesta produção, como o da construção do mito do führer e a difusão da ideologia nazista.

 

            Considerações finais


Acreditamos ter alcançado os objetivos propostos neste pequeno ensaio: o de analisar a manipulação politica-ideológica contida na produção cinematográfica O triunfo da Vontade, visando como instrumento principal de propaganda este filme. Também acreditamos ter chegado a conclusão de que apesar, de Hitler ser uma pessoa carismática e com uma ótima oratória, a transformação no mito de führer talvez só poderia ser construída a partir desta produção cinematográfica.





   Referências Bibliográficas


Brecht, Bertolt. Poemas: 1913-1956. São Paulo: Ed. 34, 2000.

Dihel, Paula. Propaganda e Persuasão na Alemanha Nazista, São Paulo: 1ª Ed. Editora Annalume, 1996.

Hitler, Adolf. Minha luta, Porto: Ed. Afrodite, 1976.

Hobsbawm, Eric J. Era dos Extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Ed. Companhia das Letras, 1995.

Junior, José NivaldoMaquiavel o Poder: História e Marketing, São Paulo: Ed. Martin Claret, 2005.

Lutzer, Erwin W. A cruz de Hitler: como a cruz de Cristo foi usada para promover a ideologia nazista, São Paulo: Ed. Vida, 2003.

Pesavento, Sandra Jatahy. História & História Cultural, São Paulo: Ed. Autêntica, 2000.

Stackelberg, Roderick. A Alemanha de Hitler: origens, interpretações, legados, Rio de Janeiro: Ed. Imago, 2002.

Vieira, Maria do Pilar de Araújo, A Pesquisa em História, São Paulo - 2ª edição -Ed. Ática 1991.


 assista o filme on-line: 


[1] Lutzer, Erwin W. A Cruz de Hitler. São Paulo: Ed. Vida, 2003. P.17.
[2] Stackelberg,Roderick. A Alemanha de Hitler, Rio de Janeiro, Ed. Imago-2002. Pág. 93
[3] Brecht, Bertolt, Poemas 1913-1956-São Paulo, ed.34-2000 pg.15.
[4] Marques, Adhemar Martins, Historia contemporânea através de textos, São Paulo, ed. Contexto-1997 pg.150.
[5] Hitler, Adolf, Minha Luta, Porto- Ed. Afrodite- 1976.Pág. 247.
[6] Pesavento, Janathy Sandra.História & História cultural. São Paulo-Ed. Autêntica. 2000 pág. 87.
[7] Lutzer, Erwin W. A cruz de Hitler. São Paulo. Ed. Vida. 2003 pág. 52.
[8] Pesavento, Jatahy Sandra. História & História cultural.São Paulo-Ed. Autêntica. 2000 pág.86.

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